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2 de dezembro de 2021 | Morad

A comunidade de violência doméstica e familiar em condomínios

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Quem nunca conheceu ou conviveu com um tigre de papel? Aliás, no âmbito das leis é possível se deparar com vários tigres de papel. Nesse sentido, muitas são as leis que transparecem qualidades e alardeiam soluções para questões delicadas, tais como o combate e a prevenção da violência doméstica e familiar no ambiente condominial, mas que, na realidade, não passam de rematadas decepções.

Oportuno se faz esclarecer que a metáfora “tigre de papel” vem da cultura chinesa e tem por significado algo que é aparentemente ameaçador, mas que, na realidade, é inofensivo.

É justamente essa a sensação que emana da lei estadual nº 17.406/21. Com efeito, por meio da edição dessa lei, tornou-se obrigatória no Estado de São Paulo, a partir do dia 15/11/21, tanto para síndicos quanto para administradoras, a comunicação de ocorrências ou mesmo de indícios de ocorrências envolvendo violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, adolescentes e idosos.

Mais especificamente, a legislação em questão impõe aos síndicos e às administradoras o dever de comunicar imediatamente esse tipo de ocorrência às autoridades competentes, por meio telefônico ou por aplicativo móvel, nas hipóteses em que a violência estiver sendo praticada, isto é, em andamento. De acordo com essa lei, tal comunicação, nas demais hipóteses, deverá ser realizada por escrito, por meio físico ou digital, no prazo de até vinte e quatro horas a partir da ciência da respectiva ocorrência.

Necessário se faz ressaltar, contudo, que se de um lado a mencionada lei estadual impõe aos síndicos e às administradoras o dever de comunicar às autoridades competentes a ocorrência de eventos dessa natureza, de outro lado não prevê nenhuma sanção para desencorajar o descumprimento deste comando legal.

É bem verdade que o projeto original previa penalidades para síndicos e administradoras desobedientes, tais como advertências e até mesmo multas pecuniárias reversíveis em prol de fundos e de programas de proteção à mulher, à criança, ao idoso e ao adolescente. Tal particularidade, contudo, foi vetada pelo Governador de São Paulo ao sancionar essa lei. Segundo o mencionado chefe do Poder Executivo estadual, as mencionadas penalidades são incompatíveis com a legislação federal pertinente.

A grande questão que se sobressai de um tema tão delicado e recorrente como esse, ou seja, a violência doméstica e familiar, diz justamente a respeito da eficácia de uma lei desprovida de mecanismos encorajadores do comportamento por ela prescrito, ou seja, a denúncia desse tipo deplorável de violência no âmbito condominial.

Aliás, nesse sentido, já asseverava o célebre jurista alemão Rudolf von Jhering, desde o início do século passado, que uma regra de Direito desprovida de coação jurídica é como o fogo que não queima, é como chama que não ilumina.

Não resta a menor dúvida que as iniciativas legislativas, tais como a mencionada Lei nº 17.406/21, não são uma solução definitiva para esse grave problema. Mas, apesar disso, é possível afirmar que a edição de leis harmônicas com os anseios da população, bem estruturadas juridicamente e dotadas de mecanismos encorajadores ao cumprimento dos comportamentos nelas contidos, compatíveis com o nosso estágio de evolução social, não configuram apenas importantes ferramentas para a prevenção e o combate eficaz à violência doméstica e familiar no âmbito condominial, mas, também, constituem importante fator desestimulante para aqueles que, indiretamente — tais como síndicos e administradores —, contribuem para a perenidade desse gravíssimo problema social, com os seus comportamentos omissos e alheios ao sofrimento daqueles que padecem com esse tipo de violência.

Enfim, por maior que seja a boa vontade do legislador estadual em relação a esse importante e delicado tema, é forçoso reconhecer que a lei nº 17.406/21, desprovida de mecanismos destinados a encorajar síndicos e administradoras a realizar denúncias sobre casos de violência doméstica e familiar no âmbito condominial, é tão vistosa e tão eficiente quanto um tigre de papel!

José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL

 

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