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10 de outubro de 2019 | Morad

O tratamento da pessoa jurídica e do grupo econômico na lei da liberdade econômica

lei da liberdade econômica
lei da liberdade econômica

 

A recente conversão da MP 881/19 na Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, conhecida comumente como lei da liberdade econômica — cujos princípios norteadores são a liberdade como uma garantia no exercício das atividades econômicas, a boa-fé do particular perante o poder público, a intervenção subsidiária e excepcional do Estado e, por fim, o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o ente estatal —, consolidou de vez as normas que haviam sido estabelecidas pela presidência da República para proteger a livre iniciativa e o livre exercício de atividades econômicas.

Aliás, em relação a esse assunto, impõe-se destacar o especial tratamento conferido à pessoa jurídica, por meio das alterações promovidas por essa lei no Código Civil, que reforçaram o entendimento de que ela não se confunde com os respectivos sócios, tampouco com os seus associados, seus instituidores e respectivos administradores (cf. CC, art. 49-A).

De igual modo no que concerne à respectiva autonomia patrimonial. Aliás, a esse respeito, oportuno se faz ressaltar que o parágrafo único do artigo 49-A do Código Civil — incluído na legislação ordinária pela mencionada lei da liberdade econômica —, reconheceu expressamente a autonomia patrimonial da pessoa jurídica como uma importante forma de alocação e segregação de riscos legalmente estabelecida para estimular empreendimentos, gerar empregos, tributos, renda e inovação em prol de todos.

Contudo, se de um lado a lei da liberdade econômica reconhece e protege, no âmbito da pessoa jurídica, a distinção entre os seus sócios e a sua autonomia patrimonial, por outro lado permite a sua desconsideração nas hipóteses em que houver abuso envolvendo a respectiva personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, para alcançar não apenas os bens particulares do administrador, mas, também, do sócio beneficiado direta ou indiretamente pelo abuso (cf. CC, art. 50, com a redação dada pela lei da liberdade econômica).

É importante ressaltar, a esse respeito, que o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia consolidado entendimento sobre a importância desse remédio jurídico no âmbito das relações juridicamente tuteladas. Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, da 4ª Turma dessa corte superior, “o instituto da desconsideração da personalidade jurídica se apresenta como importante mecanismo de recuperação de crédito, combate à fraude e, por consequência, fortalecimento da segurança do mercado, em razão do acréscimo de garantia aos credores, atuando, processualmente, sobre o polo passivo da relação, modificando ou ampliando a responsabilidade patrimonial” (cf. STJ, REsp. nº 1.729.554/SP 2017/0306831-0; j. 08/05/18).

Assim, se o sócio ou o administrador, em razão de conduta abusiva, forem por conta disso beneficiados financeiramente ou por qualquer outra forma capaz de mensuração econômica, poderão, por força da legislação pertinente, ser alcançados pela desconsideração da personalidade jurídica, para restituição da integralidade do proveito obtido, seja ele de ordem financeira ou econômica, por meio de seus patrimônios pessoais.

Também é importante ressaltar que a desconsideração da personalidade jurídica só alcança o sócio dotado de poder de gestão. Já os demais, desprovidos desse poder e que de alguma forma obtiveram benefícios indevidamente, não poderão ser responsabilizados por conduta abusiva, mas, em vez disso, apenas por enriquecimento ilícito.

Outra particularidade digna de nota sobre a lei da liberdade econômica são os contornos por ela delineados a respeito dessa abusividade, caracterizada legalmente pelo desvio de finalidade e pela confusão patrimonial.

Mais especificamente, para efeito dessa lei, considera-se desvio de finalidade a utilização da pessoa jurídica com o propósito de prejudicar credores ou praticar atos ilícitos de qualquer natureza (cf. CC, art. 50, § 1º, incluído pela lei de liberdade econômica); e, de outra feita, considera-se confusão patrimonial a ausência de separação entre patrimônios, nas hipóteses em que houver, por parte da sociedade, o cumprimento repetitivo de obrigações pertinentes ao sócio ou ao administrador, e vice-versa, ou, então, a transferência de ativos ou de passivos sem as correspondentes contraprestações, ou, ainda, qualquer outro tipo de ato que afronte a necessária autonomia patrimonial da pessoa jurídica (cf. CC, art. 50, § 2º, incisos I “usque” III, incluídos pela lei de liberdade econômica).

Ainda em relação a esse tema, impõe-se destacar que a mera existência de grupo econômico não autoriza, por si só, a desconsideração da personalidade jurídica. Assim, o simples fato de uma determinada pessoa jurídica pertencer a um grupo econômico não autoriza a respectiva responsabilização por obrigações inerentes a outra pessoa jurídica pertencente a esse mesmo grupo (cf. CC, art. 50, § 4º, incluído pela lei de liberdade econômica).

Aliás, oportuno se faz mencionar que esse tipo de questão já havia sido anteriormente objeto de lapidação no âmbito da Justiça do Trabalho. Mais especificamente, com a introdução no ordenamento jurídico da reforma trabalhista promovida pela Lei nº 13.467/17, a mera da identidade de sócios, por si só, passou a ser descartada, desde então, como requisito único e suficiente para a caracterização de grupo econômico (cf. art. 2º, § 3º, da CLT).

Enfim, as alterações promovidas na legislação ordinária pela mencionada Lei nº 13.874/19 — lei da liberdade econômica —, constituem aprimoramento importante e significativo no tratamento das questões envolvendo a autonomia da pessoa jurídica, a desconstituição da respectiva personalidade jurídica e a responsabilização de seus sócios e administradores, vez que conferem maior segurança jurídica a todos que pretendem empreender e exercer atividades econômicas.

José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL

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