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17 de abril de 2024 | Morad

O ATRASO NO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES

O ATRASO NO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES

Segundo a sabedoria popular, prometer e não dar faz o bobo alegrar. E, cá entre nós, esse tipo de galhofa até funciona numa divertida roda de amigos. Já no mundo dos negócios, contudo, a coisa não é bem assim.

Aliás, não é incomum um fornecedor — ora compreendido como aquele que, na condição de pessoa física ou jurídica, desenvolve atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços —, com a finalidade de assegurar um negócio ou mesmo com a intenção de levar vantagem em uma disputa com um concorrente, prometer algo muito além da sua capacidade, principalmente quando isso envolve a estipulação de prazo para a conclusão de um serviço ou para a entrega de um bem.

E, para piorar ainda mais esse cenário, enrolar o pobre cliente, tanto na base do “jeitinho” quanto por meio de promessas vãs, até que a obrigação possa ser cumprida, passa a ser um expediente comum nesse tipo de situação.

O grande problema disso é que o descumprimento de uma obrigação, na maioria esmagadora das vezes, causa sérios transtornos ao cliente que, na condição de contratante ou de um simples consumidor, está contando com a execução do serviço contratado ou com a entrega do bem prometido, tanto no tempo quanto na forma e no lugar convencionados.

Nesse tipo de situação, cabe ao desafortunado cliente fazer valer os seus direitos e exigir aquilo que lhe é devido. Para tanto, a melhor opção é valer-se de uma notificação extrajudicial, que tem duas finalidades básicas. A primeira delas é instar o fornecedor, de produtos ou de serviços, a cumprir aquilo que foi prometido. Já a segunda finalidade é constituí-lo em mora, em caso de inércia.

A esse respeito, nunca é demais lembrar que a mora, em linhas gerais, nada mais é do que o descumprimento de uma obrigação no tempo, forma e lugar convencionados entre as partes.

Assim, o cliente lesado, uma vez caracterizada a mora, poderá, de acordo com a legislação pertinente, pleitear judicialmente a resolução (extinção) do contrato, com a consequente devolução das quantias adiantadas, acrescidas de juros e correção monetária; poderá aceitar um outro produto ou prestação de serviço equivalente; ou, então, poderá exigir o cumprimento forçado da obrigação; sem prejuízo, em todos esses casos, de pleitear concomitantemente indenização por perdas e danos, tanto emergentes quanto lucros cessantes, inclusive ressarcimento por danos de ordem moral.

É importante ressaltar que os contratos são regidos por princípios fundamentais, dentre os quais se destacam o princípio da obrigatoriedade das convenções e o princípio da boa-fé objetiva. E é justamente por isso que os contratos são feitos para serem cumpridos, e que as partes, ao contratarem, devem agir entre si com lealdade, transparência e veracidade.

Nessa toada, se não houver um bom motivo para justificar o descumprimento daquilo que foi prometido — e até então não cumprido—, ou seja, se não houver um motivo capaz de eximir a responsabilidade do fornecedor pelo atraso no cumprimento daquilo que foi pactuado entre as partes, tal como o caso fortuito e a força maior, ele estará sujeito às consequências já mencionadas anteriormente.

Diante desse panorama, a primeira e mais importante recomendação a ser feita para o fornecedor em relação a esse tipo de questão é bem simples: não prometer aquilo que não poderá ser cumprido.

Nunca é demais lembrar que o Poder Judiciário costuma ser rigoroso com a parte que não observa o princípio da boa-fé objetiva.

Por conta disso, e até mesmo em razão das peculiaridades que envolvem os vários cenários — no mais das vezes adversos, desfavoráveis e extremamente competitivos — em que o fornecedor atua, algumas medidas poderão, talvez, atenuar a eventual a falta de observância do prazo estipulado para o cumprimento daquilo que foi prometido.

Uma delas é a indicação, no corpo do pedido ou no próprio contrato, de causas supervenientes capazes de influir negativamente no prazo de entrega. Cláusulas dispondo que os prazos de entrega estabelecidos poderão ser alterados por motivos de força maior, que impeçam seu cumprimento, tais como, mas não exclusivamente, greves, interrupção dos meios normais de transporte e fornecimento, condições meteorológicas excepcionalmente prejudiciais, costumam propiciar bons argumentos para o fornecedor e até mesmo remediar esse tipo de situação.

Mas temos de convir que isso, por si só, é insuficiente, mesmo porque, no âmbito jurídico, a aplicação eficiente disso em casos concretos, além de padecer de limitações, não costuma ser uma tarefa simples.

Outra questão importante, no âmbito das causas supervenientes, consiste em deixar claro na proposta todas as causas que possam modificar o negócio e/ou as condições inicialmente ajustadas, ou que porventura possam ou venham, ainda que potencialmente, influir no respectivo prazo de entrega, tais como alterações solicitadas pelo cliente, atraso na execução de providências a ele cabíveis, atrasos com fornecedores etc.

Além disso, outra medida atenuante, passível de ser utilizada nesse tipo de situação, consiste na indicação de um prazo de entrega estimado. Algo como “prazo estimado de entrega” em vez de “prazo de entrega”.

Impõe-se ressaltar que esse tipo de artifício não serve para justificar atrasos demasiadamente elásticos e desprovidos de razoabilidade.

Em negócios complexos e de grande monta, que demandem contratos específicos e minuciosamente detalhados, poderão também ser delineadas ressalvas nas motivações contratuais. Além disso, no próprio corpo do contrato, poderão ser introduzidas cláusulas específicas, dispondo sobre a possibilidade de repactuação de prazos, principalmente nas hipóteses em que o pagamento do preço estiver atrelado à entrega do bem ou à evolução dos serviços contratados.

Tais artifícios de ordem jurídica costumam ajudar e até mesmo atenuar as consequências de atrasos compreendidos em lapsos razoáveis de tempo, mas não eliminam os problemas daí decorrentes e nem constituem salvaguarda para que o fornecedor entregue aquilo que prometeu quando puder ou quando bem entender.

É preciso ter em mente que o cliente tem todo o direito de exigir o cumprimento daquilo que lhe foi prometido, inclusive valer-se de notificação para instar o fornecedor a cumprir o prometido ou mesmo para constituí-lo em mora, para posterior ajuizamento da medida judicial que entender cabível.

A esse respeito, é importante destacar que o cliente, ao notificar o fornecedor, não poderá, por si, promover a imposição de multa diária em caso de atraso, já que esse tipo de medida, de um modo geral, carece de previsão contratual e somente é passível de aplicação por força de ordem judicial nesse sentido

Enfim, conforme já salientado, a melhor coisa que o fornecedor pode fazer, para evitar esse tipo de situação, é não prometer aquilo que não poderá ser cumprido.

José Ricardo Armentano

 MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL