Pois é! Não há nada mais decepcionante para um credor do que perceber que todos os esforços empregados em um trabalhoso processo executivo foram em vão, em virtude de expedientes maliciosos do devedor executado, destinados a desviar, onerar ou até mesmo se desfazer do respectivo patrimônio, com o mal, digo, com o “bem” disfarçado fim de evitar que eles sejam objeto de constrição judicial.
Apesar da legislação pertinente dispor, de forma categórica, que a alienação ou a oneração do patrimônio do devedor durante a tramitação de ação capaz de reduzi-lo à insolvência são consideradas modalidades de fraude à execução, ainda assim tais expedientes são frequentemente empregados por devedores executados.
Uns dizem que esse tipo de argúcia faz parte da natureza humana, já outros dizem que isso é fruto do desespero. O fato é que esse tipo de conduta, além de afrontar a legislação pertinente, causa enormes transtornos ao credor que busca a satisfação de seu crédito perante o Poder Judiciário.
Imagine um devedor espertalhão que, previamente ciente de uma execução tramitando em seu desfavor e beneficiando-se da lentidão do Poder Judiciário, transfere, por exemplo, o seu reluzente Chevrolet Corvette 1959 ao seu mais querido brother ou, então, onera um bem localizado terreno por meio de uma hipoteca, em decorrência de uma operação simulada de mútuo ajustada com um fraterno camarada, com a finalidade de impedir a penhora e tornar infrutífera a consequente alienação judicial desses bens.
Mas e aí? O que fazer em uma situação dessas? Certamente orar em louvor à Santa Edwiges não será uma boa opção! A não ser que a situação desse infeliz credor se torne desesperadora caso ele não consiga a satisfação judicial de seu crédito, muito provavelmente essa caridosa santa da igreja católica, em virtude da respectiva vocação protetora em prol dos pobres e endividados, terá mais simpatia ao sofrimento do ladino devedor, que poderá perder todos os seus estimados bens em prol de um impiedoso credor.
Diante dessa situação, o que esse — agora — pobre credor poderá fazer para evitar os maliciosos expedientes desse devedor?
E a resposta é simples. A legislação pertinente faculta aos credores algumas medidas protetivas capazes de evitar ou tornar ineficazes expedientes dessa natureza, comumente utilizados para fraudar os processos de execução. Dentre essas medidas destaca-se a averbação premonitória prevista no artigo 828 do Código de Processo Civil.
Segundo o mencionado dispositivo legal, o credor exequente poderá obter uma certidão a respeito da admissão da execução pelo juiz, contendo a identificação das partes e o respectivo valor, para efeito de averbação no registro de imóveis e no registro de veículos.
Tal medida, além de evitar a fraude à execução, tem por finalidade impedir que o devedor executado, beneficiando-se da lentidão dos processos executivos — tanto no que concerne à eventual demora em relação ao despacho inicial, quanto em relação à própria citação —, desfaça-se ou onere o respectivo patrimônio para prejudicar o credor.
É importante ressaltar que a averbação premonitória é passível de ser levada a efeito perante todos os órgãos e entidades em que houver sistemática de registro, tais como as Juntas Comerciais (caso haja pretensão quanto à oportuna penhora de quotas sociais), ou, então, a ANAC (caso tal pretensão recaia sobre uma aeronave), ou até mesmo os órgãos competentes para a emissão da Guia de Trânsito de Animais – GTA, tais como o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado do Mato Grosso – INDEA/MT (caso o devedor tenha a intenção de penhorar algumas vaquinhas leiteiras da raça girolando). Vale dizer que esse tipo de medida se aplica a todo e qualquer bem suscetível de penhora, arresto ou indisponibilidade.
Impõe-se ressaltar que esse remédio legal não é, tampouco tem os efeitos de uma penhora. Trata-se, em vez disso, de uma medida protetiva destinada a assegurar que o resultado do processo executivo seja útil e possibilite a satisfação do crédito do credor.
Nessa toada, se o devedor, antes de ser citado, espertamente resolver vender seus bens a terceiros em fraude à execução ou onerá-lo de modo a tornar infrutífera eventual alienação judicial (cf. CPC, art. 792, II), tais operações poderão ser facilmente desfeitas pelo juiz da execução. Não será necessário, para tanto, a propositura de uma ação pauliana, tampouco qualquer outra medida para tanto. No exemplo em questão, o devedor espertalhão até poderá vender o seu reluzente Corvette ou mesmo gravar o seu precioso terreno. Mas tais expedientes de nada valerão a esse esperto devedor, vez que essa venda ou essa oneração, por caracterizarem fraude à execução, serão irremediavelmente desfeitas pelo juiz da execução.
Se até na Bíblia Sagrada para tudo há um tempo adequado — Eclesiastes 3 —, com a averbação premonitória não é diferente, já a legislação pertinente determina que ela poderá ser requerida tão logo a execução proposta pelo credor seja admitida, isto é, assim que a citação do devedor executado for determinada. Usualmente esse tipo de medida é requerido na própria petição inicial, onde o credor exequente, de antemão, requer que, após a determinação da citação, seja emitida a certidão para efeito de averbação premonitória.
Oportuno se faz ressaltar que esse tipo de medida até poderá ser requerido antes de ser iniciada a execução ou até mesmo no curso de uma ação de conhecimento, todavia, por meio de tutela antecipada, que somente será deferida se estiverem presentes, na oportunidade, os elementos que evidenciem a probabilidade do direito invocado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Após a realização da averbação premonitória deverá o credor, na condição de exequente, informar o juiz da execução, nos dez dias subsequentes, as averbações por ele realizadas (cf. CPC, art. 828, § 1º).
Posteriormente, assim que for formalizada a penhora sobre bens suficientes para a satisfação da dívida, deverá o credor, necessariamente, nos dez dias subsequentes, providenciar o cancelamento das averbações pertinentes aos bens que não foram penhorados (cf. CPC, art. 828, § 2º), por meio de um simples requerimento ao órgão que procedeu a averbação.
Vamos supor que o mencionado Corvette do devedor utilizado a título de exemplo seja, por si só, suficiente para a satisfação da dívida executada. Diante desse panorama, caso tenha sido realizada, também, tal averbação em relação ao terreno do devedor, deverá o credor promover o respectivo cancelamento. Pouco importa que o devedor, sob a óptica desse inconformado credor, seja um mal intencionado espertalhão e mereça, em razão disso, queimar lentamente no fogo do inferno e sofrer toda a sorte de retaliações. O fato é que se o credor, por negligência ou por espírito emulativo, não proceder ao cancelamento dessa averbação no prazo legal, o próprio juiz da execução determinará tal providência, sujeitando o vingativo — ou negligente — credor a indenizar os prejuízos disso decorrentes. Em outras palavras, se a averbação premonitória for manifestamente indevida, ou seja, se for excessiva, de modo a recair sobre vários bens, quando apenas um seria suficiente para garantir a execução, ou, então, se após a realização de penhora desse bem, tal averbação não for cancelada em relação aos demais bens do devedor, sujeitar-se-á o credor ao ressarcimento dos eventuais os prejuízos sofridos pelo devedor daí decorrentes (cf. CPC, art. 828, § 5º).
Evidencia-se, portanto, que a averbação premonitória é, de fato, uma eficiente medida protetiva ao credor, vez que, ao ser efetivada, gera presunção de fraude nas onerações e nas transmissões de bens realizadas a partir de então. Consequentemente, tais bens — em virtude dessas operações não surtirem efeitos —poderão ser alcançados pelo juízo da execução onde e com quem estiverem, de modo a assegurar, ao final da execução, a satisfação do crédito executado!
José Ricardo Armentano
Advogado no escritório Morad Advocacia Empresarial
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