Não é à toa que os cães são considerados os melhores amigos do homem, que os gatos não gostam de beijos e que o icônico escritor e comediante britânico Douglas Adams
— qualquerque seja o lugar onde ele possa estar na galáxia — é muito grato pelos peixes.
E a razão disso é muito simples: os animais ocupam, realmente, um relevante papel no âmbito das relações
humanas.
E até aí, como bem diria a irreverente banda de pop rock carioca Blitz, “tá tudo muito bom, tá tudo muito bem”.
A coisa toda começa a complicar quando ocorre o rompimento das relações afetivas de um casal, sem consenso quanto ao tratamento e à destinação do respectivo e amado animalzinho de estimação. E, quando isso ocorre, a coisa fica mesmo tensa, de modo que os conflitos e as disputas daí decorrentes acabam invariavelmente sendo decididas no âmbito do Poder Judiciário.
Nesse sentido, várias são as questões que estão sendo atualmente discutidas perante o Poder Judiciário, dentre as quais se destacam a destinação, a guarda compartilhada e a visitação de animais após a separação do casal, inclusive pensão e compartilhamento de despesas. Isso quer dizer, então, que os animais de estimação foram alçados à condição humana ou quase isso?
Com efeito, não é bem assim. Mas trata-se, à evidência, de um tema muito delicado, não apenas por conta da gigantesca carga emocional nele envolvida, mas, também, por conta da mudança comportamental da sociedade ao longo do tempo e da evolução — nesse contexto — das relações existentes entre as pessoas e seus animais de estimação, que os percebem e os enxergam como fieis amigos, bons companheiros ou até mesmo como verdadeiros filhos.
Oportuno se faz ressaltar que o legislador, sensível a esse tipo de questão, está propondo, por meio de projeto de lei, de iniciativa da Senadora Rose de Freitas (PODEMOS/ES), em andamento perante o Senado Federal desde 2018, dar tratamento ao compartilhamento da custódia de animal de estimação de propriedade comum, quando não houver acordo na dissolução do casamento ou da união estável, bem como alterar a legislação processual ordinária, de modo que as normas relativas às ações de família passem a ser aplicadas aos litígios dessa natureza (cf. PLS 542/2018).
No âmbito desse tema, muito se discute, no mundo jurídico, se os animais de estimação devem ser tratados meramente como coisas ou como sujeitos de direito — isto é, entes em relação aos quais o legislador houve por bem outorgar direitos, independentemente deles serem pessoas ou não —, ou, então, se devem ser equiparados à criança e ao adolescente ou simplesmente ser alçados a uma categoria intermediária entre coisas e pessoas.
A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar um emblemático e pioneiro caso em que foi reconhecido o direito de ex-companheiro visitar animal de estimação após a dissolução da união estável, manifestou o entendimento segundo o qual os bichos não podem ser considerados como meras coisas inanimadas, tampouco como sujeitos de direito. Segundo o relator desse julgamento, ministro Luis Felipe Salomão, em razão do vínculo afetivo estabelecido entre eles e os seres humanos, reconhece-se um “terceiro gênero”, cuja análise, caso a caso, deve priorizar o ser humano e o respectivo vínculo afetivo com o animal. Na visão dessa turma julgadora, os animais não são coisas e nem sujeitos de direito, mas, em vez disso, encontram-se em uma categoria intermediária e, por conta dessa particularidade, merecedora de uma tutela especial.
Aliás, na esteira dessa particularidade, encontra-se pendente de julgamento, perante o próprio Superior Tribunal de Justiça, questão versando sobre o cabimento de “pensão alimentícia de animais de estimação” (cf. STJ, REsp 1.944.228/SP).
Por mais que se possa argumentar que toda essa discussão envolvendo animais de estimação constitui um tema de somenos importância em nosso contexto social, ainda assim é forçoso reconhecer que ela afeta parcela significativa da população. E não é para menos, afinal, segundo a ABINET — Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, estima-se que o Brasil tem a maior população de cães, gatos e aves canoras e ornamentais em todo mundo e é o terceiro país em população total de animais de estimação.
Enfim, por conta da própria evolução desse tema ao logo do tempo e da importância e dos benefícios da interação entre humanos e animais, faz-se necessário tanto o respectivo tratamento legislativo adequado, principalmente sobre a destinação, a cusstódia e a manutenção de animais após o rompimento de casamento ou de união estável, quanto o
posicionamento claro e uniforme do Poder Judiciário a respeito de toda essas questões.
José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL
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