A morte é um conceito que não se limita ao simples aspecto físico ou material. Vai muito além
disso, já que pode ser compreendida sob várias matizes e em diversos âmbitos, sejam eles
metafóricos, filosóficos, religiosos ou até mesmo jurídicos, dentre outros de igual relevância.
Especificamente no âmbito jurídico, contudo, a coisa é mais simples. De acordo com a
legislação pertinente, a existência da pessoa natural — da forma como a concebemos —
termina com a morte (cf. CC, art. 6º).
Trata-se, na realidade, de um fato jurídico relevante, pois a sua ocorrência implica na extinção
da personalidade jurídica, na sucessão de bens, no término das relações de parentesco, na
dissolução do vínculo matrimonial etc.
A morte, em regra, pode ser constatada pela simples ausência de funções vitais. Geralmente é
declarada por um médico, por meio de um documento formal denominado atestado de óbito.
Mas nem sempre isso é uma tarefa fácil. Imagine, por exemplo, alguém cujo coração, apegado
desesperadamente à vida, teima em pulsar, a despeito do respectivo cérebro já envolto na
sombria escuridão da inoperância. E é justamente aí que que o legislador entra em cena para
dirimir esse tipo de questão. Nesse caso, especificamente, é a legislação extravagante que
define a morte encefálica como o termo final da vida (e.g., Lei nº 9.434/97, art. 3º).
Até aí, nada de extraordinário, mesmo porque, nesse tipo de hipótese, há um corpo capaz de
possibilitar a cabal identificação da cessação da vida.
Mas o que ocorre quando não há um corpo? Imagine, por exemplo, um marinheiro cujo navio
naufragou no meio do oceano revolto ou mesmo um aventureiro desaparecido na “amistosa e
hospitaleira” ilha Sentinela do Norte.
Bem, nesse caso, a legislação ordinária, isto é, o Código Civil, indica duas hipóteses em que a
morte poderá ser presumida.
A primeira delas refere-se à possibilidade de declaração de ausência, isto é, declaração judicial
de que a pessoa natural desapareceu misteriosamente, sem dar notícia de seu paradeiro, de
modo a possibilitar a respectiva e oportuna abertura da sucessão definitiva (cf. CC, art. 6ª, in
fine).
Nesse caso, há a preocupação do legislador em tutelar o patrimônio e proteger os interesses
daquele que, sem deixar um representante ou um administrador, desapareceu
misteriosamente. Somente após o reconhecimento judicial da ausência como uma morte
presumida é que é autorizada a abertura da sucessão definitiva.
Já a segunda hipótese diz respeito à possibilidade de declaração de morte presumida sem a
necessidade de decretação de ausência (cf. CC, art.7º, incisos I e II).
Essa hipótese se dá quando é extremamente provável a morte daquele que estava em perigo
de vida (cf. CC, art.7º, inciso I). Exemplos disso podem ser ilustrados com a trágica explosão do
ônibus espacial Challenger, nos idos de 1986, onde os respectivos tripulantes foram
pulverizados em uma colossal explosão, ou com o infame e criminoso rompimento da
barragem de Brumadinho, onde pessoas foram inexoravelmente engolidas por um gigantesco
mar de lama.
Ou, ainda, tal hipótese também ocorre quando alguém desaparecido ou prisioneiro de guerra
não é encontrado após dois anos do término do respectivo conflito bélico (cf. CC, art.7º, inciso
II).
Se no mundo literário é possível identificar, com segurança, uma morte anunciada, tal como a
do trágico personagem de Gabriel Garcia Marquez, Santiago Nasar, na célebre obra Crônica de
uma morte anunciada, na vida real a coisa é um pouco diferente, já que, embora certa, nem
sempre é possível atestar a sua certeza. E nessa toada, se o legislador, em relação à morte, não
conseguiu dar jeito tampouco conserto, conseguiu, ao menos, ajambrar um jeito de presumi-
la, mesmo que ela seja incerta ou cercada de mistérios.
José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL
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