O anseio de ter alguém para compartilhar a vida de maneira romântica é comum à maioria das pessoas, pois a convivência social faz parte da natureza humana. No entanto, apesar desse forte desejo de encontrar companhia, existem aqueles que se aproveitam dessa necessidade para obter benefícios indevidos do parceiro.
É bastante frequente ver pessoas que foram enganadas, especialmente através de plataformas digitais, acreditando estar em um relacionamento amoroso, mas, na verdade, a situação é diferente. Algumas dessas pessoas são manipuladas de forma desonesta, com o objetivo de que o outro se beneficie da confiança e intimidade construídas na relação.
O estelionato sentimental é a expressão utilizada para descrever situações em que uma pessoa se utiliza de laços afetivos para obter vantagens indevidas de outra, seja financeira ou patrimonial. Embora o termo não seja formalmente tipificado no Código Penal, ele pode ser enquadrado no crime de estelionato previsto no art. 171. Esta prática levanta questões complexas no campo do direito penal, pois envolve a sobreposição de vínculos emocionais e condutas criminosas.
Também conhecido como “golpe do amor”, ocorre quando o agente engana a vítima por meio de falsas promessas afetivas ou manipulações emocionais com o intuito de obter um benefício econômico ou patrimonial. Nesse contexto, a confiança e a intimidade desenvolvidas na relação são exploradas de forma ilícita.
Embora a relação entre as partes seja fundada em laços pessoais ou amorosos, o dolo do agente está em utilizar tais sentimentos para realizar fraudes. Em casos típicos, o criminoso ganha a confiança da vítima e, posteriormente, faz pedidos de dinheiro, empréstimos, ou se apropria de bens da vítima, alegando situações emergenciais ou justificativas enganosas.
Para a configuração do crime de estelionato sentimental, é necessário observar os seguintes elementos: a intenção clara de enganar a vítima desde o início da relação ou durante o seu desenvolvimento; a fraude deve ocorrer por meio de manipulação sentimental, ou seja, o uso do afeto ou da confiança da vítima como meio de engano; deve haver um prejuízo financeiro ou patrimonial concreto para a vítima, seja pela entrega de dinheiro, bens, ou outros benefícios ao agente; e a obtenção de uma vantagem indevida com a fraude, configurando o aspecto econômico do crime de estelionato.
Um exemplo prático é o caso de indivíduos que, através de aplicativos de relacionamento, conquistam a confiança da vítima, constroem uma relação virtual ou física e, posteriormente, solicitam empréstimos ou transferências de dinheiro para solucionar supostos problemas emergenciais.
Um dos grandes desafios no enquadramento e na condenação em casos de estelionato sentimental é a produção de provas. Dado que o crime envolve uma relação afetiva, muitas vezes há dificuldade em distinguir o que seria uma decepção amorosa comum de uma fraude penal. O ônus da prova recai sobre a vítima, que deve demonstrar que foi enganada de forma dolosa e que sofreu prejuízos materiais decorrentes dessa fraude.
A prova documental, como mensagens de texto, transferências bancárias, e-mails e testemunhas que possam atestar a manipulação sofrida pela vítima, é fundamental para a configuração do crime. Além disso, a análise da evolução do relacionamento e das promessas ou pedidos feitos pelo agente podem corroborar a tese de fraude.
No âmbito cível, é possível solicitar indenização por danos morais e materiais. Para isso, é fundamental comprovar os prejuízos sofridos, sendo necessário que a vítima reúna o máximo de evidências possíveis para demonstrar que foi induzida ao erro, que o responsável agiu de má-fé ao tirar proveito da situação e que houve perdas de natureza patrimonial.
O estelionato sentimental é uma prática ilícita que explora a confiança e os laços afetivos para obtenção de vantagens patrimoniais, configurando uma forma de fraude que, apesar de não estar expressamente prevista no ordenamento jurídico, pode ser enquadrada no crime de estelionato.
A manipulação emocional utilizada para enganar a vítima apresenta desafios tanto para a comprovação do dolo quanto para a produção de provas, já que a linha entre uma decepção amorosa e uma fraude penal pode ser tênue. Contudo, a reunião de evidências claras, como registros de comunicação e transferências financeiras, pode ser crucial para o sucesso de uma ação penal ou cível.
A crescente incidência de casos em ambientes digitais, como aplicativos de relacionamento, reforça a necessidade de maior conscientização e cautela por parte das vítimas, bem como o aprimoramento das práticas jurídicas para garantir que esse tipo de conduta não fique impune.
Morad Advocacia Empresarial