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11 de novembro de 2019 | Morad

A assembleia condominial e o condômino

Assembleia Condominial
Assembleia Condominial

Se para o historiador britânico Arnold Tonybee o maior castigo para aqueles que não se interessam por política é ser governado por aqueles que se interessam, no âmbito do condomínio edilício a situação não é muito diferente disso, vez que todas as questões condominiais e de interesse geral, tais como a gestão e a prestação de contas, a previsão orçamentária, a realização de obras, sorteio de vagas de garagem, dentre outras, são discutidas e decididas em assembleia pelo voto dos condôminos participantes.

Duas são as modalidades de assembleia previstas na legislação pertinente: a ordinária, na qual são tratadas especificamente as aprovações de contas e de orçamento anual do condomínio, a alteração do regimento interno, a eleição de síndico etc. (cf. CC, art. 1.350); e a extraordinária, onde são deliberados outros assuntos de interesse do condomínio, tais como a realização de obras, a aplicação de multas a condôminos etc. (cf. CC, art. 1.355 e 1.337).

Cabe ao síndico convocar todos os condôminos, na forma prevista na respectiva convenção, para a assembleia que será realizada e dar previamente ciência a eles sobre os assuntos que nela serão tratados (cf. CC, art. 1.359). Aliás, a legislação pertinente é clara ao dispor que a assembleia não poderá deliberar se todos os condôminos não forem convocados para a reunião (cf. CC, art. 1.354). Caso o síndico deixe de convocar a assembleia, um quarto dos condôminos poderá fazê-lo (cf. CC, art. 1.350, parágrafo 1º). E se a assembleia não se reunir, caberá ao Poder Judiciário, a requerimento de qualquer condômino, decidir os assuntos pertinentes ao condomínio (cf. CC, art. 1.350, parágrafo 2º).

A legislação que rege essa matéria indica o quórum a ser observado para cada tipo de questão. A aprovação de contas, o aumento da taxa condominial e a eleição do síndico, por exemplo, demandam, de um modo geral, votação da maioria dos presentes (cf. CC, art. 1.352). Já as questões envolvendo a alteração da convenção, por exemplo, demandam dois terços (2/3) de todos os condôminos. E a mudança de destinação do condomínio, em razão da importância desse tipo de matéria, depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos (cf. CC, art. 1.351).

Impõe-se ressaltar que o resultado da assembleia a todos vincula, inclusive aqueles que nela não compareceram — pessoalmente ou por meio de um procurador — e não votaram!

Isso quer dizer, então, que assembleia é soberana, ou seja, que o resultado de uma assembleia condominial é absoluto e vinculante, de modo a obrigar o síndico e todos os condôminos?

Bem, é quase isso. Mais especificamente, somente assim será se a decisão tomada em assembleia não afrontar a lei, não desobedecer a respectiva convenção, não violar direitos individuais dos condôminos e for comunicada a todos na forma da lei — isto é, por escrito e com aviso de recepção (cf. Lei nº 4.591/64, art. 24, parágrafos 1 e 2).

Oportuno se faz ressaltar que o descumprimento das formalidades legalmente estipuladas para a realização da assembleia, bem como a violação da convenção, do regulamento interno e dos direitos dos condôminos, são fatores que ensejam, conforme o caso, a anulabilidade ou a nulidade da assembleia. A principal diferença entre ambas está justamente nos efeitos que elas operam. Mais especificamente, a nulidade fulmina o ato defeituoso, isto é, nulo, desde o nascedouro, de modo a não produzir nenhum efeito (ex tunc). Já o ato anulável somente deixa de operar efeitos a partir da decretação da respectiva anulabilidade (ex nunc).

São nulas, por exemplo, as deliberações realizadas em assembleia que não constem expressamente da ordem do dia. Vale dizer que todas as matérias a serem discutidas em assembleia devem, necessariamente, constar na respectiva “ordem do dia”. Consequentemente, as deliberações envolvendo matérias não contempladas, ou então inseridas genérica e maliciosamente no instrumento convocatório sob o título “outros assuntos de interesse geral”, são consideradas nulas pelo Poder Judiciário e não produzem, consequentemente, qualquer efeito.

A exceção fica por conta dos casos de extrema urgência que impliquem risco à saúde e segurança do condômino, tais como a execução de urgentes medidas profiláticas contra um surto de peste negra ocorrido na vizinhança ou a imediata adoção de medidas corretivas destinadas a impedir que um invejoso prédio situado na orla de Santos supere a inclinação da famosa “Torre pendente di Pisa”.

De outra feita, são anuláveis, por exemplo, as deliberações realizadas em assembleia cujas formalidades legais não foram observadas. Mais especificamente, são passíveis de serem anuladas as deliberações havidas em assembleia cuja convocação foi irregular ou que não observou o quórum necessário para a deliberação em pauta, ou então em assembleia cuja realização foi pautada por comportamento abusivo na condução dos trabalhos. Assim, ainda que não haja empecilho quanto ao exercício do voto, será passível de anulação a deliberação que não permitir ao condômino expor a respectiva opinião sobre o assunto em discussão, ou, então, que o exonera de contribuir com as despesas para a manutenção de coisas comuns.

Nessa toada, qualquer condômino — inclusive o promitente comprador ou o cessionário — que se sentir prejudicado poderá se insurgir perante o Poder Judiciário contra a assembleia defeituosa, por meio de ação judicial destinada a desconstituí-la. Impõe-se ressaltar, contudo, que somente haverá nulidade se houver prejuízo. A esse respeito, a 5ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, ao analisar recurso em que se discutia a validade de uma assembleia condominial cujo prazo de convocação foi menor do que aquele estipulado na respectiva convenção, entendeu não se tratar de hipótese de anulação, por não ter havido na espécie prejuízo aos moradores (cf. TJ-SP; Ap. Cível 0288621-77.2009.8.26.0000; Rel. Des. Fábio Podestá; j. 25/09/13).

Outra questão importante em relação à assembleia diz respeito à participação e ao direito de voto. A esse respeito, a legislação ordinária é clara ao dispor que é direito do condômino — assim considerado o proprietário, o promitente comprador ou mesmo o cessionário — votar nas deliberações da assembleia e dela participar, desde que em dia com as respectivas obrigações condominiais (cf. CC, art. 1.335, III). Isso não quer dizer, por exemplo, que o condômino inadimplente está proibido de ingressar no recinto onde a assembleia ocorrerá, bem como de presenciar o transcorrer dos trabalhos. O que não se permite, de fato, é a participação do condômino inadimplente em discussões e nas votações de matérias de interesse do condomínio.

Caso haja prévio ajuste entre o condômino inadimplente e o condomínio, para a composição de obrigações descumpridas, seja por meio de transação, parcelamento do débito condominial ou até mesmo por meio de uma novação de dívida, por exemplo, poderá ele participar regularmente das deliberações, inclusive votar, desde que em dia com as respectivas obrigações desse ajuste.

Conforme já salientado, a assembleia é um importante instrumento para uma gestão condominial profícua e bem sucedida. Para tanto, contudo, não basta apenas uma assembleia regularmente instalada, de acordo com a legislação pertinente e de acordo com as regras estipuladas na respectiva convenção condominial. Fundamental se faz a participação de todos os condôminos. Aliás, o célebre filosofo Platão já dizia, com propriedade, que o cidadão que negligencia a política e se dedica somente às questões particulares é o responsável pelo ambiente degradante em que vive. No âmbito condominial, o mesmo raciocínio, mutatis mutandis, se aplica com perfeição à assembleia, vez que, apesar da sua expressiva importância, é, no mais das vezes, ignorada pela maioria dos respectivos condôminos, resolutos e valentes para reclamar da situação condominial, mas omissos e negligentes na hora de contribuir para uma gestão profícua e bem sucedida.

José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL

 

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