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17 de abril de 2019 | Morad

O arrematante e as dívidas tributárias e condominiais do imóvel arrematado

Dividas Tributárias
Dividas Tributárias

Imagine só aquela situação em que um camarada, após economizar por anos a fio, com esforço e sacrifício, dinheiro para comprar a tão sonhada casa própria, resolve, sentindo-se bafejado pela sorte, arrematar um belo apartamento localizado em um charmoso bairro residencial, por um preço consideravelmente mais favorável do que aquele praticado pelo mercado imobiliário.

Pois é! Aquilo que parece ser uma benção dos céus, uma recompensa pelos esforços e privações realizados ao longo dos anos, ou até mesmo uma manifestação de brilhantismo pessoal, senso de oportunidade e tino comercial, pode se tornar um verdadeiro pesadelo. Isso mesmo: um pesadelo digno daqueles personagens cinematográficos que moravam na Elm street, situada na pacata cidade estadunidense de Springwood, no progressista estado de Ohio! E isso porque, em alguns casos, a situação do imóvel não é suficientemente detalhada ou, então, é omitida no edital da respectiva hasta pública. E é justamente aí que mora o perigo, vez que o arrematante, seduzido pelo preço atrativo e premido pelo receio de fracassar na disputa desse bem, acaba deixando de lado as devidas cautelas no que concerne à necessária verificação da real situação daquilo que está sendo arrematado.

Com efeito, qualquer que seja o modo de aquisição, é essencial, para todo aquele que pretende adquirir um bem imóvel, ter amplo e pleno conhecimento a respeito da respectiva situação, para, então, com base nas informações correspondentes, realizar um juízo de valor em relação à segurança e a consequente viabilidade da operação pretendida, bem como sobre as vantagens, desvantagens e o patamar financeiro a ser observado no que tange ao respectivo preço. Esse tipo de providência, na grande esmagadora maioria das vezes, é um eficaz remédio contra dissabores futuros e gastos imprevistos com advogados e demandas judiciais.

Não é incomum um arrematante, após receber a carta de arrematação, tomar conhecimento de que há em relação ao bem arrematado dívidas condominiais e tributárias pendentes de pagamento. E é justamente nesse momento que surge a seguinte indagação: mas quem é, afinal, o responsável por esses pagamentos?

E a resposta para essa indagação, pelo menos no que concerne às verbas condominiais, tem sido objeto de discussão nos meios jurídicos.

Há aqueles que defendem que esse tipo de dívida, em razão de sua natureza (propter rem), recai sobre a coisa, ou seja, é inerente ao imóvel. Vale dizer, em razão disso, que para onde e para quem o imóvel for, essas dívidas irão atrás. Desse modo, o arrematante, ao arrematar um bem imóvel, passa a ser o responsável pelo pagamento das dívidas que sobre esse bem recai, em especial aquelas de natureza condominial.

Já outros, de forma ponderada, entendem que a arrematação é uma forma originária de aquisição da propriedade, razão pela qual o bem arrematado é transferido ao arrematante livre de quaisquer ônus. Além disso, entendem não ser razoável exigir do arrematante o pagamento de dívidas, inclusive aquelas de natureza condominial, existentes anteriormente à arrematação e que não estavam expressamente indicadas no respectivo edital. Segundo aqueles que dessa maneira pensam, além de inviabilizar e desestimular operações dessa natureza, esse tipo de exigência viola irremediavelmente o princípio da segurança jurídica. Tais argumentos encontram respaldo no próprio STJ, que ao tratar dessa matéria, tem manifestado o entendimento segundo o qual, inexistindo ressalvas no edital de praça, não é possível atribuir ao arrematante a responsabilidade pelo pagamento de dívidas condominiais existentes anteriormente à arrematação (cf. STF, REsp. 1357103-RS, 2012/0255998-8; DJ 03/03/15).

Porém, se houver prova inequívoca a respeito disso, ou seja, prova de que o arrematante tinha plena ciência sobre as dívidas condominiais existentes, ainda que não haja no edital qualquer menção a respeito delas, ele não poderá se eximir da responsabilidade pela respectiva liquidação. O STJ recentemente se manifestou nesse sentido. Segundo os ministros da Terceira Turma dessa corte superior, todos os interessados devem ser prévia e claramente informados sobre eventuais obrigações vinculadas ao bem e que porventura possam lhes ser transmitidas a partir da arrematação. A ausência de ressalvas no edital de praça impede que seja atribuída ao arrematante a responsabilidade por obrigações anteriores à alienação judicial.

Contudo, se por outro meio tal informação foi veiculada e o respectivo arrematante dela inequivocamente tomou conhecimento, a finalidade de informar antecipadamente todos os interessados sobre a real situação do bem foi razoavelmente cumprida, independentemente da forma observada, de modo a desassistir ao mencionado arrematante o direito de reclamar a nulidade da arrematação e do respectivo edital. Segundo essa corte superior, a formalidade, nessas circunstâncias, não tem o condão de se sobrepor à finalidade — aliás cumprida — da própria norma (cf. STJ, REsp. 1.523.696-RS 2015/0070207-7; j. 26/02/19).

Em relação ao IPTU o enfoque é um pouco diferente, vez que a respectiva matéria é regida sob a batuta do Código Tributário Nacional. Segundo o parágrafo único do artigo 130 desse código, na hipótese de arrematação em hasta pública, o crédito tributário relativo ao imposto, cujo fato gerador seja a propriedade, sub-roga-se no preço arrecadado. Vale dizer que o crédito tributário decorrente do imposto incidente sobre esse bem deverá ser descontado do valor pago pelo arrematante. Oportuno se faz ressaltar que o próprio STJ já se manifestou nesse sentido. Sob a óptica dessa corte superior, não é possível imputar ao arrematante tal responsabilidade tributária (cf. STJ, REsp. 1059102-RS 2007/0172311; DJe 07/10/09). Aliás, mesmo que a arrecadação em hasta pública seja insuficiente para a liquidação da dívida tributária que recai sobre o bem arrematado, ainda assim o arrematante não será responsável pelo pagamento desse débito.

Negócios realizados por meio de hastas públicas de fato são atrativos. Porém, demandam investigação e diligência para a adequada apuração de eventuais ônus existentes em relação aos respectivos bens, em especial aqueles de natureza condominial e tributária. Esse tipo de informação não é fundamental apenas para a realização de uma análise precisa dos riscos envolvidos e da aferição da respectiva viabilidade — jurídica e financeira —, mas, também, é fundamental para o próprio sucesso do negócio pretendido.

José Ricardo Armentano

Advogado no Escritório Morad Advocacia Empresarial.

Entre em contato conosco teremos muito prazer em atendê-lo.

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