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16 de maio de 2019 | Morad

O spam e o abuso de direito

O Spam e o Abuso de Direito
O Spam e o Abuso de Direito

Eis aí uma questão recorrente para quem utiliza os meios eletrônicos de comunicação: o spam!

Mas, afinal, o que é spam? Será, porventura, um personagem sem graça dos quadrinhos, que voltou dos quintos dos infernos para punir pessoas malvadas? E para responder essa questão, nada melhor do que se valer dos vastos e profundos conhecimentos daquele irmãozinho chato de alguma sedutora namorada, ou mesmo de um sobrinho adolescente mais chato ainda, filho de uma irmã mais nova qualquer, os quais, com propriedade, dirão de modo unissonante: não cabeção! Esse é o Spawn! spam é outra coisa!

E não é que eles têm razão? Spam é mesmo uma coisa completamente diferente… e igualmente chata! Segundo consta, esse termo é uma abreviação de spiced ham, que no idioma inglês quer dizer algo como “presunto condimentado” e é utilizado para designar uma mensagem eletrônica não solicitada e enviada em massa. Em outras palavras, trata-se de uma nomenclatura própria da informática para designar mensagens eletrônicas massivas e indesejadas!

Há décadas atrás, quando os aparelhos de ar condicionado automotivos eram considerados verdadeiros artigos de luxo, era muito comum andar nos dias quentes e ensolarados de verão com os vidros dos carros totalmente abertos, mesmo porque os níveis de violência, nessa época, não eram alarmantes, tais como são nos dias atuais. E cá entre nós, era mesmo prazeroso sentir a força refrescante do vento acariciar o rosto e desalinhar os cabelos — principalmente para quem os tinha em profusão! A coisa somente começava a ficar tensa quando a luz dos semáforos, conhecidos aqui em São Paulo como “faróis”, ficava vermelha. Era um verdadeiro terror, vez que nessa oportunidade, como por encanto, surgia um monte de pessoas, tal qual um bando de famintos gafanhotos, distribuindo material publicitário, na maioria esmagadora das vezes indesejado, consistente em panfletos, avisos, cupons de desconto, santinhos etc. Cá entre nós, era deveras desagradável.

É bem verdade que distribuição de propaganda, nesses moldes, diminuiu bastante desde então, já que a maioria das pessoas, por uma questão de segurança, costuma atualmente andar com os vidros dos carros devidamente fechados. Mas a prática de distribuição de material publicitário indesejado, mesmo assim, ainda continua, contudo, por meio da internet. Aliás, quem nunca se deparou, ao abrir a respectiva caixa postal, com aquelas miraculosas propagandas que prometem tornar um simples mortal em um verdadeiro Arnold Schwarzenegger, sem esforço ou sacrifício, por meio da simples ingestão de miraculosas panaceias, ou então aquelas propagandas que prometem transformar qualquer homem em um alvo certeiro para os caça talentos da Vivid Entertainment? Pois é! Trata-se, mesmo, de uma prática irritante. Sempre foi e, ao que tudo indica, continuará sendo!

Alguns, mais exaltados, incomodados com esse tipo de coisa, veem nisso um verdadeiro abuso de direito, capaz de afrontar, com todas as letras, os ditames do artigo 39, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor. Segundo eles, os ditames do mencionado diploma legal abrangem, também, esse tipo de questão, ao proibir terminantemente a entrega ou o envio de qualquer produto, ou mesmo o fornecimento de qualquer tipo de serviço, sem consentimento ou sem que tenha sido objeto de prévia solicitação do destinatário.

Mas será que é isso mesmo? Abuso de direito?

Convenhamos, essa prática é mesmo irritante. E se considerarmos o espírito da lei, além de abusiva e violar claramente a legislação consumerista, caracteriza ato ilícito, nos moldes do artigo 187 do Código Civil.

Mas, infelizmente, no âmbito do Poder Judiciário, nem todos pensam assim. E, se assim é… o que fazer então?

Eis aí uma questão delicada. Apesar das várias iniciativas legislativas nesse sentido, que vão desde requerimentos de informações sobre as práticas abusivas destinadas a assediar consumidores (p.ex., RIC 480/2019 do valente Deputado Federal Ivan do PSOL), passando por relatórios de CPIs instauradas para a investigação de crimes cibernéticos (p.ex., REL 1/2016 e RCP 10/2015 de autoria do Deputado Federal Espiridião Amin do PP/SC), até projetos de lei sobre o envio de mensagens eletrônicas não solicitadas (p.ex., PL 169/2007 da Deputada Federal Professora Raquel Teixeira do PSDB/GO), não existe propriamente, além dos citados diplomas legais (CC e CDC), uma regulamentação específica para tratar desse tipo de questão.

E é justamente por conta disso que também não há, ainda, um entendimento consolidado respeito dessa matéria. A esse respeito, a 4ª Turma do STJ, ao analisar se o recebimento de material indesejado — spam — teria o condão de ensejar direito à reparação pela ocorrência de dano moral, manifestou o entendimento de que o envio massivo de mensagens eletrônicas, por si só, não consubstancia fundamento para justificar ação de dano moral, principalmente por conta dos avanços tecnológicos da atualidade, que permitem a eliminação, o bloqueio ou mesmo a recusa desse tipo de material. Portanto, se não houver ataque à honra ou à dignidade de quem recebe esse tipo de material, não haverá, de acordo com essa câmara superior, nexo de causalidade capaz de justificar eventual condenação por danos morais (cf. STJ, 4ª Turma, REsp. 844736/DF 2006/0094695-7; j. 27/10/09).

Diante desse panorama, aliás, pouco promissor até o presente momento, é forçoso reconhecer que se para o tal do Spawn esse tipo de questão pode ser simplesmente resolvido com umas poucas fagulhas incendiárias provenientes lá dos confins dos infernos, para nós, pobres mortais, a cousa toda, de igual modo, também não é algo de difícil resolução. Para tanto, basta que o spam, ou melhor, basta que a mensagem indesejada seja simplesmente apagada ou, então, bloqueada ou até mesmo descartada automaticamente — por meio de alguma engenhosa configuração cibernética da própria caixa postal — para uma pasta de lixo eletrônico. Simples assim… pelo menos para os doutos ministros da 4ª Turma do STJ!

José Ricardo Armentano

Advogado no Escritório Morad Advocacia Empresarial

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