Se para o cantor Roberto Carlos, o eterno rei da Jovem Guarda, o esquecimento, juntamente com uma boa dose de amor sem fim, é um santo remédio para o sofrimento, para o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, a conversa é outra.
Para esse ministro, o direito ao esquecimento, além de não estar previsto no ordenamento jurídico, é incompatível com a Magna Carta. E é justamente com base nesse entendimento que o seu voto foi proferido no Recurso Extraordinário de nº 1.010.606, ainda em andamento perante a Suprema Corte.
O caso em questão gira em torno de um litígio envolvendo familiares da vítima de um polêmico e revoltante crime ocorrido no Rio de Janeiro, na longínqua década de 50, e a TV Globo. Mais especificamente, os familiares da vítima, inconformados com a reconstituição jornalística do aludido crime em um programa dessa emissora de TV, sem a devida autorização, buscaram reparação perante o Poder Judiciário.
A esse respeito, é importante ressaltar que a pretensão reparatória desses familiares já havia sido rejeitada em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do RJ. E isso porque a Magna Carta, sob a óptica dessa ilustre corte, garante a liberdade de expressão e comunicação, independentemente de censura ou licença.
Mas, afinal, o que é o direito ao esquecimento?
De um modo simplista, é possível dizer que se trata do direito do indivíduo — alicerçado nos princípios da dignidade humana, inviolabilidade da vida privada e inviolabilidade da privacidade — não ser lembrado de situações pretéritas constrangedoras, mesmo que verídicas.
Trata-se de um assunto que vem ganhando cada vez mais relevância nos dias atuais, principalmente por conta das novas tecnologias, cada vez mais abrangentes e eficientes tanto na captação quanto na divulgação da informação. E nesse contexto, vem crescendo a discussão, principalmente em questões envolvendo crimes e condenações criminais, sobre o direito da vítima e de seus familiares não serem atormentados, e sobre o direito daquele que já pagou a sua dívida perante a sociedade não ser eternamente condenado pela opinião pública, em decorrência da reprodução reiterada, contínua e exaustiva de fatos delituosos pretéritos e dolorosos, pelos mais diversos meios de comunicação.
Segundo os defensores da tese do esquecimento, não se trata de um estratagema jurídico destinado a apagar fatos, mas, apenas e tão somente, de um modo humano e sensato de impedir que fatos dolorosos sejam ressuscitados sem causa ou critério relevantes, com consequentes danos a todos os envolvidos, desde a vítima ou seus familiares, que passam a reviver traumas passados, até o próprio autor do delito, que por conta disso, é prejudicado em seu processo de ressocialização.
Para o ministro Dias Toffoli, contudo, casos dessa natureza, tais como o de ngela Diniz, Daniella Perez, Marielle Franco, dentre outros, não podem e não devem jamais ser esquecidos.
Segundo a tese de repercussão geral de nº 786, colocada em pauta pelo mencionado ministro no julgamento — ainda em andamento — do Recurso Extraordinário de nº 1.010.666, a respeito da aplicabilidade do direito ao esquecimento na esfera cível quando for invocado pela própria vítima ou pelos seus familiares:
“É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível.”
Enfim, trata-se, mesmo, de uma questão delicada e relevante, razão pela qual caberá à corte suprema julgar o Recurso Extraordinário de nº 1.010.606 com discernimento e sabedoria salomônica, para nortear, de vez, o entendimento do Poder Judiciário a respeito do espinhoso conflito entre o direito ao esquecimento e a liberdade de informação.
José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL
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“DA UTILIZAÇÃO DE DCTFS COMO MEIO DE PROVA DE INATIVIDADE DE PESSOA JURÍDICA”