Um dos problemas mais frequentes no âmbito do condomínio edilício é, sem dúvida nenhuma,
o ruído excessivo proveniente de unidades condominiais vizinhas.
Não é incomum, no universo condominial, a existência de vizinhos egoístas e desrespeitosos,
que teimam, noite adentro, realizar festas barulhentas, ouvir música em volume
demasiadamente alto, tirando o sossego e a tranquilidade dos demais moradores.
Muito se discute sobre as medidas a serem tomadas nesse tipo de situação, e não é raro
encontrar aconselhamentos para que o problema seja inicialmente tratado por meio de uma
conversa franca e cordial com o condômino faltoso. De fato, esse tipo de medida, entre
pessoas razoáveis e de bons princípios, costuma funcionar. Contudo, com pessoas
desarrazoadas e insensíveis, isso é assustadoramente ineficaz. De qualquer forma, há quem
diga, mesmo assim, tratar-se de uma tentativa válida!
Antes de qualquer iniciativa, deve ser ponderado, com razoabilidade e sensatez, se o objeto da
reclamação é mesmo algo significativo ou se trata apenas de uma mera implicância ou uma
simples insatisfação. E a razão disso é bem simples: nesse tipo de questão, o ruído reclamado
tem necessariamente de superar a fronteira do mero aborrecimento, de modo a causar
incômodo significativo e insatisfação ao homem médio, ao homem comum, enfim, às pessoas
próximas.
É importante ressaltar, também, que a proibição de ruído excessivo não se limita apenas ao
período noturno. Essa proibição abrange qualquer barulho ininterrupto e excessivo que
perturbe a tranquilidade das pessoas, qualquer que seja a hora do dia ou da noite.
Feitas essas ponderações, é preciso saber, de antemão, quais são as regras do “jogo”. Aliás,
sob esse aspecto, é um tanto desanimador constatar que a legislação ordinária, mais
especificamente o Código Civil, trata desse tipo de questão de forma um tanto superficial.
Mais especificamente, o artigo 1.336 desse diploma legal apenas dispõe que é dever do
condômino não utilizar as partes que lhe cabem no condomínio — tais como a unidade
condominial, as áreas comuns etc. — de forma prejudicial ao sossego.
Por conta disso, é importantíssimo verificar previamente as regras de convivência delineadas
na convenção e no próprio regulamento do condomínio, principalmente no que concerne à
produção de ruídos, utilização do salão de festas, realização de obras etc., vez que são
justamente esses regramentos que definem o modo, as condições e os horários em que ruídos
ou tais eventos são permitidos ou tolerados. Aliás, são esses regramentos que dispõe,
também, sobre a sistemática de advertências e punições em caso de violação das regras de
convivência.
Diante desse panorama, deverá ser realizada uma reclamação no livro de ocorrências ou
encaminhada ao síndico, detalhando o tipo de violação, a data, o horário e, se possível, a
duração estimada. É importante destacar que essa reclamação deverá ser por escrito e poderá,
inclusive, ser encaminhada por e-mail ou mesmo por intermédio da administradora do
condomínio.
As medidas realizadas pelo síndico ou pela administradora, sejam elas avisos ou advertências,
também deverão ser formais, ou seja, por escrito, com comprovação de recebimento por parte
do condômino faltoso.
Se o condômino faltoso, advertido mais de uma vez, continuar fazendo barulho e negando a
autoria de qualquer tipo de infração — mesmo diante de robustas evidências em sentido
contrário —, aí a melhor solução será a imposição de multa, na forma prevista e delineada
pelo regulamento do condomínio.
Impõe-se ressaltar que a imputação de multa deverá observar a sistemática de aplicação
contida no respectivo regulamento condominial. Demais disso, a multa, nesse caso, não
deverá ser vista como uma mera medida punitiva, mas, longe disso, deverá ser encarada como
um verdadeiro estímulo ao condômino faltoso, para que ele passe a ser mais cuidadoso com as
regras de convivência do respectivo local de habitação.
A imposição de multa também deverá ser formal, ou seja, por escrito e com comprovação de
recebimento por parte do condômino faltoso. Nela deverá ser indicada a infração, o
dispositivo do regulamento que autoriza a aplicação de multa e o respectivo valor, bem como
deverá ser mencionada a quantidade de avisos e advertências infrutíferas já encaminhadas
anteriormente. É importante salientar que deverá ser necessariamente concedida a
oportunidade de defesa, para que ele possa exercer amplamente o respectivo direito de se
defender.
Se ainda assim o condômino faltoso continuar perturbando o sossego e a tranquilidade dos
moradores, aí não restará alternativa ao condômino prejudicado senão buscar auxílio perante
o Poder Judiciário, por meio de ação judicial, com a finalidade de cessar compulsoriamente tal
perturbação, sob pena de aplicação de multa diária a ser judicialmente fixada, bem como com
a finalidade de obter reparação pelos danos porventura provenientes da conduta faltosa,
tanto materiais quanto morais.
É importante destacar que a grande dificuldade em relação às demandas judiciais com esse
viés concentra-se na produção de prova sobre a conduta ofensiva do condômino faltoso.
Assim, o condômino prejudicado, caso queira intentar a via judicial, deverá lançar mão de
todos os meios de prova admitidos na legislação processual, tais como testemunhas, provas
periciais, testemunhais e documentais, tais como áudios, vídeos, boletins de ocorrência etc.,
para comprovar os fatos que constituem o seu direito, sob pena de um retumbante fracasso.
O TJ-SP, recentemente, ao apreciar demanda judicial envolvendo a produção de ruído
excessivo, além do limite tolerável, por parte de condômino, em decorrência de frequentes e
barulhentas festas por ele realizadas fora do horário permitido, admitiu, como prova disso,
conjunto probatório consistente em registros no livro de ocorrência do condomínio,
comparecimento da Polícia Militar, registro de ruídos realizados por funcionários, aplicação de
multas etc. (cf. TJ-SP, Apelação Cível 1050307-32.2018.8.26.0576; j. 16/07/20). Nem sempre
um conjunto probatório com essa feição é suficiente para amparar um pleito judicial, que
poderá, conforme a complexidade ou especificidade do caso, demandar a realização de perícia
judicial onerosa e de difícil produção. E é justamente por conta desse tipo de particularidade
que a via judicial, antes de ser intentada, deverá ser muito bem analisada e avaliada quanto à
respectiva conveniência e viabilidade.
Por fim, oportuno se faz ressaltar que em casos extremos e reiterados, onde as medidas
previstas no regulamento do condomínio restaram ineficazes, e onde a perturbação põe em
risco à saúde e a segurança de todos os condôminos, é possível pleitear judicialmente a
exclusão do condômino antissocial do âmbito condominial. Trata-se, contudo, de medida
drástica, cuja discussão quanto ao respectivo cabimento não é pacífica em nossos tribunais.
José Ricardo Armentano / advogado na MORAD ADVOCACIA EMPRESARIAL